Escrevo para me manter viva, sentir nas sílabas o pulsar das veias, envolver cada patética palavra inventada com o sonho que me atravessa o peito.
É nestes sons emaranhados de silêncios, patéticos desabafos, que sinto que respiro e busco algum alimento, e desalmadamente verto inteira a alma e o corpo, derramando tudo o que tenho até à última gota.
Obra da fase azul, "a vida", a que mais gosto. ( Não publico aqui Guernica por respeito ao quadro e ao que significa).
Fase azul, a primeira fase de Picasso, sendo que é também das mais reconhecidas. Nesta fase o tema é a vida, incluindo as suas obras essencialmente melancolia, tristeza, sofrimento, solidão, pobreza, morte, dor, nomeadamente o horror da guerra.
Aqui guardo tudo o que é bom de guardar. Principalmente as lições do tempo. A dor das lutas. A coragem das conquistas, a força, o silêncio... os pedaços que sozinha tive de unir...
Às vidas que deixei partir.
Prefiro a vida sem filtros , é sempre mais bonita e verdadeira. O fim do dia aconteceu assim, por aqui, como todos os fins que me pertencem.
Os dias vão minguando, a lua acende-se mais cedo, mas o sol brilha esquecendo que é outono. O mar está calmo e morno embriagado nos seus azuis. Os rios correm serenos sem sofrimento entre as margens. Os poetas escondem-se nas sombras das árvores pelo tempo desnudadas, descascam romãs no banco do jardim, escrevem poemas nas folhas mortas.
As horas claras vão minguando,as noites de insónia crescendo, alimentando o sonho que em cansados lençóis de cetim vai desdobrando os dias em versos.